Faz uns seis meses que começou um processo de novas aprendizagens pra mim. Primeiro foi no período eleitoral. As eleições de 2018 foram importantíssimas para me fazer esclarecer que tipo de pessoa eu quero ser, que tipo de pessoa eu quero perto de mim, o que eu estou disposta a fazer ou não para defender aquilo em que eu acredito. E essas análises não foram meramente baseadas em quem apoiava candidato(a) A ou B, e sim nas ideias, falas e atitudes que pude observar. As eleições, inclusive, não acabaram em outubro. Até hoje o debate ideológico me causa momentos de reflexão, principalmente os discursos que surgem após acontecimentos trágicos - que, para a nossa tristeza, tem sido muitos neste ano de 2019. Muitas "máscaras", por assim dizer, foram despidas diante deste contexto turbulento na seara política.
E não parou por aí. Tive uma experiência pessoal, muito dolorosa, de desentranhar de mim a ideia de um alguém. Uma ideia irreal, de pessoa admirável e querida, que infelizmente, cometeu crimes, revelou-se um indivíduo de muitas facetas, como vidros que refletem imagens diferentes, vidros cortantes que me partiram o coração pelos reflexos sombrios que tive que parar de ignorar, e finalmente, ser capaz de ver, confrontar e rejeitar.
E mais. Deparei-me com outra situação de crime, essa não tão pessoal, mas que também me decepcionou muito, e que me levou novamente a duvidar da minha capacidade de conhecer as pessoas, além de me fazer questionar quais erros eu poderia cometer também, quais erros eu poderia perdoar e quais consequências eu desejo para quem incorre neste ou naquele tipo de erro.
Perante todos estes acontecimentos, que vejo como parte de um mesmo processo, pondero. Queria me despir da necessidade de assumir o papel de juíza, o papel de responsável por punir e corrigir o que está errado, e de agir para que o bem e o correto prevaleçam. Depois, entendi que não posso fugir deste papel, porque enquanto ser social, compete a mim proteger outras pessoas, e para isso, o julgamento, a punição e a correção são necessários.
Carrego, em mim, a cultura de criar empatia e tentar justificar pecados alheios. Como se isso fosse sinônimo de "ser luz". Isso é, na verdade, excesso de complacência. E não é um hábito meu, isolado. Costumamos ser complacentes com crimes do colarinho branco, vide políticos comprovadamente corruptos que são amados e defendidos. Costumamos ser complacentes com relacionamentos abusivos, vide índices de violência doméstica. Costumamos ser complacentes com sonegadores de impostos, crimes ambientais, crimes corporativos. Só não costumamos ser complacentes quando a violação parte da periferia, da pobreza, da pele negra, e atinge outro grupo social. Esta constatação me apavora.
Ser luz requer sabedoria. Por isso, esse processo. Eu aprendi que a impunidade gera malfeitores. Jamais serei contra direitos humanos ou apoiarei ideias violentas e discursos de ódio. O que eu quero combater é a ausência de consequências para crimes e ilegalidades, e isto, essencialmente, requer o declínio da desigualdade com que tratamos os(as) criminosos(as). É uma limpeza de conceitos - antes tarde que mais tarde.
Nós, privilegiados(as), economica, etnica ou intelectualmente, precisamos também temer as implicações e punições legais para os nossos atos. Precisamos parar de nos proteger como um grupo homogêneo, que prescinde de cárcere, porque é "capaz de conviver em sociedade". Porque o status social é, alegadamente, atestado de caráter. Porque ter um diploma, uma renda, um apartamento, uma família linda ou determinada cor não condiz com o perfil de um(a) criminoso(a). Precisamos parar de atribuir a Deus a responsabilidade pela punição dos(as) nossos(as), como se nós mesmos(as) fôssemos muito frágeis para estabelecer a justiça.
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